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HACKERS, CRACKERS & PHREAKERS EM POÁ

 "Quando eu ando assim meio down.. vou pra Porto e Bá! Tri-legal.. " (Música de Kleiton e Kledir)

Derneval R.R. Cunha

A primeira vez que fui em Porto Alegre fazem quase dez anos, pelo SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência). Uma das coisas boas de se entrar pra faculdade. Você pode se inteirar da produção científico cultural do Brasil e ainda conhecer outras capitais. Para alguém como eu, acostumado com a vida em São Paulo e Rio de Janeiro (onde se desconfia de tudo e de todos), a cidade é cheia de surpresas agradáveis. A comida, por exemplo, é boa e não é cara. A população é acolhedora ao extremo (você faz uma cara de quem está perdido, já te perguntam se podem ajudar). É tão estranho, mas tão estranho, essa hospitalidade (olha que eu tenho histórias e histórias) que parece piada. Eles é que estão certos, devia ser assim em todo lugar do planeta. Claro, no interior do Brasil pode se encontrar muitos lugares hospitaleiros. Mas não numa capital de estado.. sei lá.. Outra cultura, outra colonização. Dá um medo de pisar na bola que é terrível.

Alguns anos depois, voltei de novo, para conhecer a Fernanda Serpa, responsável pela campanha  "Support Kevin". A primeira em todo mundo a defender os direitos humanos do Kevin Mitnick. Hoje, até a revista Forbes reconheceu que o Hacker em questão não teve um tratamento justo pela legislação americana. Mas quem viu isso primeiro foi ela. De total ignorante de informática foi fuçando até conseguir ver algumas pessoas começarem a adotar idéias DELA. Ativista da Anistia Internacional, lutou e conseguiu ser ouvida. O pessoal foi atrás e montou suas próprias campanhas. Sem darem o devido crédito, paciência. Algum dia esta história será contada (tô escrevendo). Fiquei alguns dias lá, conheci algumas pessoas. Dessa vez, fui de novo pelo ônibus do SBPC, mas com outro objetivo acadêmico. Conhecer o computer underground de POÁ (Porto Alegre, para os íntimos).
Não foi muito fácil. Tive que comparecer à varios encontros. Negociar o que ia falar, o que não ia. Convencer que eu era um cara que merecia confiança, ao contrário da maioria dos jornalistas, que só querem saber de sensacionalismo. E mesmo convencendo foi difícil.
Agora, falando sério (o parágrafo acima foi piada)... não foi tão difícil assim. Fiquei hospedado na casa de alguns membros do grupo. E todo mundo se conhece. De vista, de chat, de festa ou por conhecer a "Ema". Uma figura central no chat da tchurma, um canal que nem vou falar o nome, num provedor do Rio Grande do Sul. Invite-only. Não precisei me apresentar. Pelo contrário. De acordo com muitos, o fanzine Barata Elétrica foi o primeiro nas BBSes de todo o RS, apesar de feito para a Internet. Pelo jeito, foi o primeiro de muitas BBSes de todo o Brasil. Precisei ir lá para ouvir isso.
Foi uma fila de pessoas me hospedando. O primeiro que conheci foi o Chacal. Fiquei na casa dele alguns dias. Não parece rato de computador, a primeira vista. Até começar a conversar contigo. O mais próximo que já encontrei de um dark-side hacker, tipo Kevin Poulsen. Merecia uma biografia. Conhece algo de telefones, para variar. Só anotei uns papos. É daqueles que mata a cobra e mostra o pau (de acordo com depoimentos, em vários sentidos). Nada de Nerd, cheio de mulheres. Coyote foi outro, me deu umas idéias muito boas sobre o que é a geração ano 2000. O pessoal que usa internet até para namorar. Outros que conheci foram o Bash (autor de um fã-zine sobre linux), o Naja (maior papo legal), Whirred (um que já sofreu altos problemas e hoje abandonou um pouco a fuçação). Acho que não esqueci ninguém.. ah, sim..
No sábado antes de ir embora, a Ema me fez o  "grande" favor de colocar frente a frente os dois mais famosos fanzineiros do computer underground nacional. Entre parênteses porque a princípio, não era muito fãs da idéia de conhecer a moçada que fez o Axur05. Mas seria a mesma coisa que ir a Paris e não subir na Torre Eiffel (se bem que já fui em Paris, morei meses naquela cidade-luz e não fiz isso, de propósito). Então, o pessoal fez toda aquela festa de hacking e fui lá, apertar a mão do pessoal que me xingou um pouco, nos primeiros números. Gente fina, o Cshell. Infelizmente conversamos pouco tempo (só 2 ou 3 horas). Até concordei em tirar uma foto junto com ele e o Acid (que pedi para não divulgarem). Altas trocas de experiências em termos do que é fazer um fanzine no Brasil.
Foi interessante ouvir que sim, tal como eu pensava, a idéia deles não era me deixar por baixo, mas estabelecer um novo tipo de Fanzine, com outro tipo de ética. Foi o que entendi. Apesar que ainda assim fiquei meio chateado por conta da atitude de um (agora ex) membro do fanzine.( Imagina só o que é estar no meio de um encontro de hackers e ouvir alguém falar na sua frente:  "Barata Elétrica? Maior podreira, meu " ficou todo mundo rindo da gafe do cara que não sabia quem eu era). Minha idéia foi fazer a cabeça da moçada. Eles também tinham consciência desse lance. Mas tinham que chutar o pau da barraca com alguém e meu fanzine era o que tinha mais evidência. Propuseram fazer uma edição conjunta, seria o lado técnico deles mais a retórica que é minha característica. Não sei. Quando terminar um dos livros, conto mais desse papo que foi muito bom e valeu a pena.
O que mais me impressionou no grupo (que não tem um nome, é apenas uma turma normal, guardadas as devidas proporções e descontando a alta capacidade técnica e "tara" por Linux) foi o quanto o pessoal se distancia da imagem de Nerd. Sim, alguns, como o CShell, começaram tipo 10 anos de idade. Outros como o Noface, o cara já pintou e bordou meio mundo afora, tem uma biografia extensa (a entrevista dele fica para ... ooooouuuuutra ocasião) como hacker, cracker, phreaker, etc. Mas é um pessoal que sai a noite, vai em festas, faz festas, tem namoradas (um ou outro usa o termo no plural). Zoam pra caramba (Chacal quando tá afim, faz uma voz de mulher que engana bem).. Me senti meio velho.
Tanto que me levaram numa boite. Aqui em São Paulo eu não vou, normalmente. Estava há anos namorando a mesma menina e nunca fui disso.  "Ficar" é uma palavra que ainda não entendi direito. Aí chego lá e.. é o tipo de lugar onde NINGUÉM é de NINGUÉM (coisa difícil de entender, a palavra Swing não faz parte do vocabulário gaúcho, verdadeiro tabu). Um exemplo também de como as coisas são o contrário lá. Em São Paulo, um espaço  "cult" acaba virando um espaço  "gay". Lá, um espaço  "gay" virou  "cult", abriu para o público. E .. tinha um alguns gauchos se beijando lá.
E mulher bonita pra caramba. Tipo: Vânia Candia, Andréa Greco, Ana Elisa Peixoto, Mônia Vogel, Patrícia Lessa, Aneliese Schulman, Solange Fischborne, Marta Moesch.. (capa de Playboy ou Ele-Ela). Coisa de cair o queixo. Uma boa parte, loiras ou morenas de olho azul, verde, cinza, etc.. Não tinha "não existe mulher feia foi você que não bebeu demais". Fiquei tão besta que cheguei a perguntar pra uma delas se ela entrava no Chat ou se conhecia o fanzine Barata Elétrica. Coisa de Nerd, né? Pois é. Muito tempo namorando a mesma pessoa enferruja. O pessoal morreu de rir quando me viu fazendo isso. Devem estar comentando até hoje. O fato é que, apesar de hacker em POÁ ter a maior fama entre o mulherio, voltei sem ter conhecido ninguém, no sentido bíblico da palavra.
Teve um cara que se inclinou como os japonêses fazem (em sinal de respeito), quando soube quem eu era. Sinceridade. Não é porque os caras te conhecem. Qualquer pessoa na rua te trata como se te fosse teu amigo.
Mas ouvi uma histórias boas, suficiente para uns dois livros. Uma boa foi quando um lamer apareceu numa festa. Todo mundo conhece todo mundo e ninguém sabia quem tinha chamado o cara. Festa só de linuxeiro e micreiro esperto. O cara tinha chegado falando que fazia e acontecia. Interessante como não basta ser lamer, tem que se mostrar. E falava, e falava. Tinha lido o "M@rmiteiro e a Rede" todinho ou outro texto qualquer, se achava o máximo. Botaram um teclado e monitor na frente dele para demonstrar. Não sabia fazer nada. Aí o pessoal resolveu fazer uma disputa:  quem errasse, bebia um copo de vinho. Daquele tipo  "sangue de boi". Quando algum cara da turma errava, colocavam meio copo. Quando o tal lamer errava, era um copo inteiro. Desmaiou de tanto beber. Faltou o toque final. Jogaram clara de ovo na cueca dele e.. falaram que o sujeito não era mais virgem. Uns dias depois desmintiram, antes que fosse num psiquiatra ou na polícia, falando que tinha sido estuprado.
Nem vale a pena comentar um cara desses. É bom saber que existem as m@ç@s podres, porém. Denorex. Se aparecer um cara num jornal querendo se mostrar como hacker, se liga. Ninguém tem muita vontade de aparecer. O pessoal lá já se tocou como a imprensa trata o assunto de forma sensacionalista, buscando sempre o  "Diário de um jovem Envenenador " (filme até razoável, embora meio deprê). Em outras palavras, uma confissão de crimes. Alguns dos caras que conheci praticaram alguma forma de acesso não autorizado. Mas não tive muitos detalhes. O que me faz pensar que são gente fina. Caras que ficam se gabando na TV de ter feito isso e aquilo tropeçam no que dizem, cedo ou tarde.
Praticamente todo mundo lá só usa Linux. Respiram Linux. ICQ de linux, Smart Office, Perl, etc.. Linux tudo (poucos usam Red Hat, ou é Debian ou é Slackware - coisa pra fuçador mesmo). E é para aprender a fuçar, não para ficar detonando a vida dos outros. Caras que se viram para o computador unicamente como forma de ganhar dinheiro perdem espaço ou saem do grupo. É a geração do ano 2000. O computador tomando o papel do que foi o telefone e se tornando uma extensão da vida da pessoa. Ainda volto lá, qualquer dia.